Antígona, de Sófocles

O mais bem sucedido dos autores trágicos terá sido Sófocles (496 a.c. – 406 a.c.). As personagens são centrais nas suas obras, com toda a acção a desenvolver-se no plano humano e rara intervenção divina. A personagem sofocliano é um ser ideal, dotada de elevados atributos humanos. Seu carácter contrasta com as outras personagens e o seu comportamento, por vezes, muda ao longo da peça. Das 7 tragédias de Sófocles que subsistem, a primeira que se pode datar é Antígona, representada em 441 a.c. [cf. PEREIRA 1980, 356].
Esta tragédia é definida pela figura e princípios da princesa Antígona. A sua história encerra o ciclo mitológico da casa real de Tebas, que começara com o rapto de Europa por Zeus e se desgraçara com a maldição de Édipo. Após a morte deste, os seus filhos lutam pelo controlo de Tebas e acabam por se matar um ao outro. [cf. HAMILTON 1991, 385-404]
Quando se inicia a tragédia, o tio Creonte toma conta da cidade e proíbe os ritos fúnebres em honra do irmão mais velho. Movida por piedade e compaixão, a corajosa Antígona pretende transgredir as ordens do rei. A irmã Ismena, na sua timidez e prudência, recusa ajudar a sepultar Polinices.
No segundo episódio, as posições antagónicas entre Creonte e Antígona entram em conflito. Ele odeia o morto, ela demonstra um amor fiel e dedicado ao defunto. Apanhada em flagrante delito, a tentar sepultar o irmão, Antígona alega que cumpria o seu dever perante as leis divinas, imutáveis e eternas. Assegura que todos na cidade consideram digna a sua acção, mas que se calam por temor ao tirano. Creonte revela um autoritarismo controlador que exige total obediência aos seus decretos. Para ele, Antígona terá o castigo merecido.Ismena é acusada de cumplicidade e quer partilhar a sorte de Antígona, mas esta recusa. Para Creonte, ambas são loucas e ordena que as amarrem.
A tragédia continua, e Hémon, filho de Creonte, tenta defender a sua noiva. Pede ao pai que revogue as suas ordens. Creonte, irredutível, decreta a pena: encerrar Antígona dentro de um rochedo em lugar deserto.
Os pontos de vista do coro, que inicialmente eram divergente dos de Antígona, foram lentamente mudando de posição, e é ele quem, após ouvir o adivinho Tirésias, censura abertamente Creonte e indica como proceder. Tarde demais: Antígona tirara a própria vida. Perante o sucedido, Hémon e a rainha Eurídice também se suicidam. Creonte terá de continuar a viver, sozinho e isolado.
Esta tragédia converteu-se numa referência da cultura ocidental. Enquanto clássico literário, representa o período em que foi produzido e atravessou milénios sem perder o seu valor. Tornou-se um modelo intemporal, reconhecido por gerações. Ela aborda questões sobre as quais podemos reflectir ou meditar acerca da condição humana. Logo à partida discute a natureza e justeza de certas leis: a lei positiva, criada pelos homens, contra a lei natural, a lei divina dos costumes ancestrais. [cf. PEREIRA 2017, 89]
Creonte quer impor as suas leis, sobrepor-se aos valores humanos. Para ele, Antígona merece ser castigada com a pena capital por se ter revoltado contra o édito real. Hémon pede ao pai que revogue as leis injustas e oiça o povo. Em defesa própria, Antígona declara estar isenta de culpa pois não violou nenhuma das leis eternas. Não é crime honrar os mortos.
O acto de dar sepultura é central em Antígona. “Ligado a ele está o de philia (“amizade”), sentimento que une estritamente duas pessoas [ e que é ] aqui sublimado numa dedicação que ultrapassa as barreiras da vida.” [PEREIRA 2017, 90]
Antígona é movida por amor, em oposição a Creonte, que odeia Polinices. Enterrar o irmão tombado na guerra é um acto de amor, dedicação e fidelidade, levado por Antígona às últimas consequências. A frase “Não nasci para odiar mas para amar” (v. 523) sintetiza os seus princípios e ecoa ao longo da peça.

BIBLIOGRAFIA:

– HAMILTON, Edith, “A Mitologia”, Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1991
– PEREIRA, Maria Helena da Rocha, “Estudos de História da Cultura Clássica”, I
Volume, 5a edição, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1980
– PEREIRA, Maria Helena da Rocha, “Traduções do Grego”, Lisboa, Fundação
Calouste Gulbenkian, 2017
– SÓFOCLES, “Antígona”, Tradução de Fernando Melro, 4a edição, Lisboa, Editorial
Inquérito, 1992


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